Aos 50 anos recém-completados, o economista Ilan Goldfajn deve ocupar, em breve, uma das cadeiras mais importantes da cúpula econômica do governo. A aposta do novo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, para conduzir o Banco Central (BC) em meio a uma grave crise econômica é um judeu engajado. Membro ativo da comunidade, ele ministrou, há dez dias – quando ainda estava na lista de possibilidades para o cargo -, uma palestra no Midrash, um centro cultural judaico no Rio de Janeiro. O tema era emblemático: “Ciclo de incertezas: o que esperar da economia”. Dez dias depois, o mercado é que se pergunta o que esperar de Ilan.

Economista com mestrado na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e doutorado pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), Goldfan já ocupou uma cadeira no BC: foi diretor de Política Econômica entre 2000 e 2003, na gestão de Arminio Fraga. Desde 2009, é economista-chefe e sócio do Itaú Unibanco.

No BC, Ilan chegou a trabalhar alguns meses com Henrique Meirelles, que assumiu a presidência da autoridade monetária no primeiro governo Lula. O economista era o sucessor de Sergio Werlang, responsável pela implantação do sistema de metas da inflação.

Goldfajn continuou e aperfeiçoou o sistema de metas de inflação. Sua principal contribuição foi o contínuo aperfeiçoamento dos diversos modelos para projeção de inflação. Com vários modelos, é possível capturar várias facetas e lidar melhor com a inflação. É um profissional extremamente competente e muito completo para a função — diz Werlang, professor da Fundação Getulio Vargas.

 

ESTILO ‘NEUTRO’

Na avaliação de Werlang, Ilan terá um estilo “neutro” na presidência do BC, nem tão conservador nem tão dovish (termo em inglês usado para descrever uma política monetária menos agressiva):

Não vai manter os juros altos sem necessidade, mas também não vai reduzir os juros mais rapidamente do que devia. Será um estilo mais como o Armínio. Se o resto do governo, sob o comando da Fazenda, tiver controle eficaz dos gastos, o BC vai poder baixar os juros.

Ao contrário do ministro da Fazenda, tido como ansioso e acelerado, Ilan é descrito como tranquilo, mas “muito firme em seus posicionamentos”. Em artigos recentes, ele demonstrou ser adepto das políticas graduais, sem choques. Em artigo publicado no GLOBO no início de abril, o economista defendeu que é necessário reduzir os juros, hoje em 14,25% ao ano, mas ressaltou que isso só deve acontecer quando a trajetória de queda da inflação se solidificar. Para ele, essa não pode ser uma decisão precipitada e deveria ser deixada para o segundo semestre, sob o risco de causar “euforia no mercado”.

A próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que decide sobre a Taxa Selic, será em junho. Essa era a data esperada pelos analistas para que o atual comandante da pasta, Alexandre Tombini, iniciasse um processo de redução dos juros.

Sobre política cambial, Ilan deu sinais em seus textos de que este também não é o momento ideal para uma apreciação cambial:

“É o momento de remar contra a corrente, recomprando dólares (via redução do estoque de swaps existente no BC) enquanto o mercado quiser vendê-los”, escreveu.

Em sua página no Facebook, o economista também publicou um vídeo defendendo a reforma da Previdência e a desindexação dos benefícios previdenciários em relação ao salário mínimo.

No mercado financeiro, quem o conhece acredita que ele terá uma boa relação com o novo ministro da Fazenda.

— Os dois irão trabalhar em boa sintonia — afirmou um profissional que já trabalhou com o economista e também conhece Meirelles.

 

‘CAPACIDADE DE INTERLOCUÇÃO’

Para Luiz Antonio França, ex-diretor do Itaú e atual presidente-sócio da França Participações, Ilan é tecnicamente um bom nome para o BC e tem excelente capacidade de diálogo:

É um economista fantástico, com conhecimento da máquina pública e experiência na iniciativa privada. Isso fecha um ciclo de capacitação para que assuma o Banco Central. Ele tem uma capacidade de interlocução muito grande.

Ilan optou pela discrição nas últimas semanas, quando seu nome começou a ser citado com possível novo presidente do BC. Após a confirmação, ele foi intensamente saudado pelos amigos nas redes sociais.

Sua excelência acadêmica e profissional também é bastante citada. Foi professor — dez anos na PUC-Rio e mais um ano na Brandeis University (EUA) — e economista do Fundo Monetário Internacional, mas também trabalhou no mercado financeiro — na Gávea Investimentos, ao lado de Armínio Fraga, e fundou a Ciano Investimentos.

Amigos e colegas de trabalho destacam sua abertura para ouvir outras opiniões e até mudar de ideia quando concorda com outros argumentos.

— Ilan é um gentleman (cavalheiro), agradabilíssimo. Não dá carteirada, ouve a opinião das pessoas. Qualquer um pode subir e falar. Se seu escritório tivesse porta, esta estaria sempre aberta — diz um colega de Itaú.

O amplo conhecimento de economia brasileira, economia mundial e teoria econômica, especialmente monetária, também é uma qualidade muito destacada. O economista Edmar Bacha, um dos criadores do plano Real, descreve o amigo Ilan como um acadêmico de primeira linha, mas que também acumulou experiência no setor privado e “passou pela trincheira” do setor público.

Para Bacha, Ilan terá o desafio de ajudar Meirelles “a colocar as contas em ordem”:

Ilan é jovem e já acumulou muita experiência. Ser presidente do Banco Central é uma função importante e um bom desafio. Agora, vamos ver como será. Suas previsões estão lá nos relatórios do Itaú e ele vinha falando que os juros iam começar a cair no segundo semestre. Mas uma coisa é projetar do lado de fora e outra é estar lá dentro.

 

CREDIBILIDADE PARA INVESTIDORES

O resgate da credibilidade do BC é o principal desafio no momento, na avaliação do economista-chefe da Opus Gestão de Recursos e professor da PUC-Rio, José Marcio Camargo, para quem Ilan tem a capacidade de fazer isso. Ignácio Rey, economista da Guide Investimentos, concorda:

Ele já passou pelo BC, tendo trabalhado com o próprio Meirelles, tem trânsito no meio corporativo e é respeitado inclusive nos meios acadêmicos. Isso será fundamental, porque o que falta é o que chamamos de ancoragem das expectativas sobre a economia. Elas precisam ser críveis aos olhos do investidor — diz Rey. — Além disso, sua experiência também pode permitir o corte juros como talvez não fosse viável há alguns meses. Só resta a saber se vai se confirmar o apoio que se espera que a equipe econômica tenha no Congresso para aprovar as medidas.

Na opinião de Rogério Freitas, da gestora Teórica Investimentos, o trabalho de “resgate de credibilidade do BC” que caberá a Ilan será turbinado pelo perfil do próprio Temer:

Mais fundamental do que o perfil de Ilan e Meirelles é o fato de que o presidente mudou. Logo, não vai acontecer o que aconteceu com o Levy, quando a equipe econômica tinha discurso diferente do da presidente. Agora, todaa equipe do governo parece pensar de forma igual.

Alexandre Espírito Santo, economista da Órama e professor do Ibmec-Rio, vê Goldfajn como “mais intransigente com a inflação do que Tombini.”

Ilan foi diretor do Instituto de Estudos de Política Econômica da Casa das Garças entre 2006 e 2009, até se mudar para São Paulo por causa do trabalho no Itaú. Na capital paulista, participou da fundação do Centro de Debate de Políticas Públicas (CDPP), que é conhecido como “Casa das Garças paulista”, ao lado de Affonso Celso Pastore, Angélica Maria de Queiroz e Marcos Alberto Lederman. Ele é casado com Denise Salomão Goldfajn, pós-doutorada em Psicologia Clínica, e pai de três filhos.

Publicado em: http://oglobo.globo.com/economia/ilan-goldfajn-excelencia-academica-tranquilidade-no-comando-do-bc-19297739