Movimento da Caixa pode ser seguido por outros bancos e desenquadrar muitas famílias

Menos de um mês após anunciar incentivos ao crédito imobiliário, a Caixa Econômica Federal, banco líder do setor, anunciou o aumento das taxas de juros do financiamento a imóveis. O movimento pode ser seguido por outros bancos e deixar muita gente fora desse mercado – e aumentar ainda mais o número de imóveis novos encalhados.

“Foi uma elevação substancial e que tem muito impacto no comprometimento de renda. Isso vai inviabilizar o crédito para muitas famílias”, diz Ana Maria Castelo, coordenadora de projetos do Ibre (Instituto Brasileiro de Economia) da FGV (Fundação Getulio Vargas).

Ela avalia que um financiamento de longo prazo com uma taxa de juros na casa dos 12% é muito alta e pode inviabilizar a compra do imóvel para muitas famílias, porque o aumento da parcela deve desenquadrá-las. Os bancos costumam limitar em 30% o comprometimento de renda familiar no financiamento habitacional.

No pacote de incentivos anunciado no começo do mês, a Caixa voltou a financiar 70% do valor do imóvel, mas o aumento dos juros será representativo nas parcelas, segundo Ana Maria. Um levantamento da Anefac (Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade) mostra que o aumento dos juros do financiamento de imóveis anunciado pela Caixa deve elevar o valor final do bem em, ao menos, R$ 75 mil.

Imóveis devolvidos

“O aumento dos juros deve piorar ainda mais a questão dos distratos”, diz a coordenadora da FGV. Distrato é um jargão usado pelo mercado para a devolução de imóveis comprados na planta. De janeiro a setembro de 2015, de cada cem imóveis vendidos, 41 foram devolvidos às incorporadoras, segundo o levantamento mais recente da agência de classificação de riscos Fitch.

Especialista do mercado imobiliário, Luiz Antônio França defende uma melhora do arcabouço jurídico para barrar a atuação de especuladores que aumentam o volume de distratos com o desaquecimento do mercado imobiliário. “O distrato mostra um desequilíbrio muito grande entre a incorporadora e o comprador”, avalia o presidente da França Participações.

Ele também defende uma nova rodada de liberação de compulsório por parte do Banco Central, como a feita ano passado, aumentando os fundos para os bancos para o financiamento imobiliário. “Isso ajudaria a fechar o ciclo do estoque de imóveis que já está no mercado, não para novos negócios”, diz França.

Sem muita opção

A Caixa se viu obrigada a aumentar as taxas de juros devido ao avanço do custo de captação de recursos. A maior parte do dinheiro para o crédito imobiliário vem da caderneta de poupança, que apresenta volumes recordes de saques desde o ano passado. No acumulado deste ano, os resgates líquidos somam quase R$ 20 bilhões.

Com isso, a Caixa passou a compor o funding com captação de recursos via LCI (Letras de Crédito Imobiliário), um instrumento mais caro que a poupança, pressionando as taxas de juros cobrada no financiamento ao cliente final.

“Não há muito o que se fazer”, diz França. Ele explica que, dessa forma, a captação da Caixa é composta por recursos provenientes da poupança a um custo de TR mais 6,17 % ao ano e mais o custo das LCIs, que pagam um percentual do CDI.

Publicado em: http://www.financista.com.br/noticias/alta-dos-juros-do-financiamento-vai-encalhar-mais-imoveis